Tão triste quanto o fato do suicídio
de um dos mais talentosos atores da teledramaturgia, é o fato de que aprendemos com ele sobre duas certezas: A primeira é que a velhice ainda é vista como uma ação de
descarte das pessoas e a segunda; o quanto o Sistema é despreparado para
ofertar realmente uma qualidade de vida para os idosos. Flavio Migliaccio disse
que a humanidade não deu certo, e é a mais pura verdade. Numa situação como a
pandemia, vemos ainda pessoas mais preocupadas em TER do que SER. Muitos
fazendo o marketing de sua solidariedade ao invés de praticá-la. Ele com
certeza se sentiu desvalorizado como profissional e como pessoa, pois diz que
tinha a impressão de que foram 85 anos jogados fora. E você? Quantos anos
jogados fora irá contabilizar? Se formos realmente esperar que o outro (irmão,
marido, esposa, filhos, sobrinhos, etc.) faça algo por nós teremos a mesma sensação
que Flávio, sabe por quê? Porque cada um é único e vive e sente de maneira
única os seus sentimentos, inclusive a sua velhice. Quantas vezes olhamos para
o espelho e percebemos uma ruga nova, compramos uma roupa e vemos que a
numeração mudou ou que ao encontrar uma foto dos tempos de escola, o quanto
tudo foi diferente do que imaginávamos? Envelhecer é inevitável, ficar velho é
opcional. Você já ouviu essa frase? Ela até que faz sentido, desde que você
tenha uma excelente aposentadoria, casa própria, um excelente plano de saúde e
possa contar com programas de rejuvenescimento, academias, fisioterapia e por
aí vai.
Encontrei outro dia um colega de
escola dos tempos da 8ª série. Ele era lindo, popular, na moda e sempre rodeado
de meninas e de outros garotos que queriam o “status” de o terem como amigo.
Neste encontro, o sorriso era o mesmo, mas seu olhar do alto de seus quarenta e
poucos anos, era triste, semblante cansado e com uma estrutura física que nem
de longe lembrava o viço da juventude. Dois casamentos falidos e um filho lindo
de viver. Mas ele, já não era o mesmo. Me perguntei: se aos quarenta e poucos
anos ele está assim fragilizado, imagine quando chegar aos 70, 80, isso, se
chegar. Ele foi o tipo de cara que não se preocupou com o amanhã, achava que
seria lindo e jovem para sempre, jovem para sempre. Ficar velho é estar em
desuso e foi isso o que Flávio, Robin Williams, Valmor Chagas, Ariclê Perez e
muitos outros famosos (fora os anônimos), provavelmente se sentiram para chegar
à conclusão de que a humanidade deu errado e que os anos que viveram, foram
jogados fora. Será que a professora que lecionada em 3 períodos, a enfermeira
que faz plantão em mais de um hospital, que o carteiro que trabalha até os 65
anos, que a mãe de 5 filhos que trabalha como diarista, que padeiro que faz o
pão de todo dia, será que todos eles serão lembrados como deveriam? Será que
serão amparados por sua família com amor, carinho, paciência, respeito e
reconhecimento pelos anos que viveram e trabalharam em prol dos outros ou para
os outros? Não saberemos ao certo, o que sabemos no momento é que envelhecer
não é para qualquer um.
É preciso ser muito forte para encarar a deterioração
do próprio corpo dia a dia e tentar manter o mínimo de sanidade psíquica e
emocional para isso. Lima Duarte fez um vídeo falando ao amigo: “Eu te entendo
Flávio...”e quantos outros também o entendem e remotamente também imaginam que
pôr um fim em tudo é o mais plausível? Cabe então aos que estão com esse
indivíduo, esse ser humano, mostrar que sua jornada não foi em vão. Ajudar a
perceber que o envelhecimento também traz consigo suas nuances positivas. Quais
são essas nuances? Pode ser desde uma aposentadoria até a certeza de que
construiu uma família com bases sólidas. Mas no fim das constas, nada disso
importa e é efêmero se você não estiver em paz com você, com suas escolhas,
decisões e com a certeza de que não depende de você o reconhecimento por tudo o
que fez ou construiu em sua vida, seja no âmbito familiar, social,
profissional, amoroso, enfim. Flávio finaliza sua carta dizendo: “Cuidem das
crianças de hoje”. – Eu diria que é um desejo genuíno de que as crianças de
hoje façam não apenas um mundo melhor, mas que tenham uma velhice digna nesse
país.
Quando a luta por uma perspectiva mais positiva da velhice começou a
ganhar forças, verificou-se uma divisão dos estudiosos em gerontologia (que
estuda o envelhecimento) que mantinha de um lado os defensores da velhice como
uma fase de perdas e de outro os novos argumentos sobre este período com possibilidade
da manutenção do engajamento ativo com a vida. Esse engajamento ativo se dá na
medida em que hábitos saudáveis são incorporados à rotina desde já. Prática de
esportes, ingestão de água, exercícios físicos, dietas mais equilibradas,
acesso à cultura, ao lazer, a promoção de atividades que promovam o bem-estar
físico, psíquico e emocional e principalmente, estar integrado e interagindo
com os outros, sejam eles da família ou não. Evidências científicas corroboram
com o argumento de que fatores modificáveis, como dieta e atividade física,
interferem no processo de envelhecimento e podem intensificar ou amenizar os
efeitos adversos decorrentes do passar dos anos (Peskind et al., 2014; Barton,
2014; Barton, 2013). Com este respaldo, as intervenções clínicas enfatizam a
prática de exercícios físicos, a moderação de ingestão de bebidas alcoólicas, a
cessação do hábito de fumar, a adequação da dieta, o envolvimento ativo com a
vida, entre outras medidas, como meios de diminuir o risco de declínio físico e
cognitivo na velhice. É importante que o idoso se sinta útil e não apenas
amparado.
Para dar o suporte necessário ao idoso, recomenda-se ler, estudar e
pesquisar sobre o assunto, mas também se possível, fazer terapia; pois muitas
vezes o processo de envelhecimento é doloroso também para quem o acompanha de
perto. Estar amparado psicologicamente é fundamental para o cuidador e para
quem está recebendo os cuidados. Em outro artigo, listamos algumas atividades
que podem ajudar na rotina e com atividades para nossos idosos.
Recomendo ainda
sobre o assunto:
Livros: Velhice – Uma nova paisagem –
Maria Celia de Abreu
Envelhecer – Histórias –Encontros –
Transformações – Pedro Paulo Monteiro
Filmes:Shirley Valentine e outro
filme é E se vivêssemos todos juntos?
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Alexandre Muniz - Psicopedagogo e
Neuropsicólogo Clínico
Referências:
-Ministério da Saúde - MS. (2009).
Estatuto do Idoso. 2. ed. rev. Brasília: Editora do Ministério da Saúde,
Recuperado em 20 de abril de 2015,
-PESKIND, E. R. et al. (2014).
Influence of lifestyle modifications on age-related free radical injury to
brain. JAMA Neurol. 71(9), 1150-1154
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