Relógio pronto para despertar. Entrar
nos links (da escola, da SME, da DRE..) e ainda verificar se os alunos postaram
as atividades para corrigir. Das 40 atividades esperadas, 12 foram enviadas, 5
incompletas, 20 disseram que enviaram e o restante não se manifestou. Volta
para acompanhar a “LIVE” do Secretário, que diz uma coisa, o Governo determina
outra e a gestão pede outra, geralmente conflituosa com as outras solicitações.
Coloca o celular no carregador, abre notebook (quem tem), pesquisa, entra no
link da escola, volta a olhar o celular, tenta acompanhar tudo e entre esse
tudo, as informações de que as escolas irão reabrir em julho, não em agosto,
não em junho mesmo. Entra no Chat, vê que o salário será congelado, que os
direitos deixaram de ser direitos e as cobranças online são muito maiores que
as presenciais. Volta para o link da sua unidade escolar, ouve da gestão que
estão todos no mesmo barco (alguns em canoas outros em jangadas mesmo), respira
fundo, volta para as atividades, atende pelo menos uns 10 pais que dizem não
entender as atividades e que as crianças não precisam passar por isso, que os
professores devem explicar direito a matéria, que eles não têm obrigação de
parar o que estão fazendo para ajudar os filhos com as tarefas e dizem não
encontrar as atividades enviadas pelos professores. Volta para o Chat, a
conexão cai, os dados móveis são rapidamente sugados pelos aplicativos pesados
que ele foi obrigado a baixar para ter acesso às orientações, reuniões e
acompanhamento do trabalho da Rede. A conexão se restabelece, ele descobre que
as escolas vão reabrir sem álcool em gel para todos, sem papel higiênico, papel
toalha, sabonete líquido e com os mesmos 40, 45 alunos confinados numa sala de
aula sem ventilador, ar-condicionado e sem sansões para quem não usar máscaras.
Olha o celular e vê 57 mensagens do grupo da escola; 18 só da coordenação e
mais umas 27 do grupo da família. Vai ao mercado com máscara e com a confiança
de que o tíquete alimentação vai dar para ajudar a comprar alguns itens
essenciais. Não deu, pois como está em casa, alguns órgãos reguladores de seu
RH acreditam que não precisa do tíquete integral. Volta para casa, toma banho
com água e sabão dos pés à cabeça, coloca as roupas para lavar e desinfeta os
sapatos. Encosta um pouco para assistir ao jornal, mais de 27.000.00 mortos, o
presidente querendo que a Economia se restabeleça, o Governador diz que não vai
afrouxar o isolamento, mas recuar e abre primeiro os shoppings, o Prefeito, diz
que há um escalonamento de reabertura gradativa para reabertura de
estabelecimentos, mas sem uma fiscalização eficaz, muitos lugares já reabriram
e ele nem sabe. Se alimenta, tentar interagir com a família, verifica o
material enviado para preparar as aulas, entre em blogs e sites de educação,
colhe material e vai dormir para descansar, afinal, amanhã será sábado e poderá
descansar um pouco. O celular vibra, ele visualiza e recebe uma mensagem do
grupo da escola: “Atenção professores, conforme o combinado, amanhã às 8hs
teremos nosso Conselho de Classe. ” Reclina na cama e sem o sono,
que fugiu diante da nova informação, assiste ao último jornal da noite. Na
tela, um parlamentar fala sobre a necessidade de gerar receita e que uma das
saídas é o congelamento dos salários dos funcionários públicos. O professor
lembra que estão há mais de 4 anos sem aumento e que nunca recebeu um reajuste
integral, sempre foi fracionado por um período de tempo tão longo, que quando
consegue receber a última incorporação daquele valor ao seu salário, já não
consegue fazer muito. Finalizando a fala em meio uma reunião, o mesmo
parlamentar chamas o funcionalismo público de parasitas. O professor, levanta
toma um café, tentar relaxar e deita novamente. O relógio pronto para despertar
o chama para mais um dia de desafios do trabalho em casa. Ele levanta, se
apruma e se coloca novamente à serviço de sua escolha profissional, afinal por
mais contas que ele tenha a pagar, ele assumiu uma responsabilidade para com
seus alunos e com ele mesmo, o compromisso de fazer a sua parte e o seu melhor
para a Educação, esteja ela como estiver.
Estes são apenas alguns fragmentos do
que os professores estão passando neste período de pandemia, isolamento social
e com a obrigação do trabalho online. Os alunos estão estressados com a
quantidade de atividades, os pais estão estressados, a gestão e também os
professores. Mas ao invés de procurarem desenvolver a empatia, muitos procuram
apontar o dedo, ofender e despejar no outro o sentimento de raiva que se formou
dentro de si por conta desse isolamento, bradando sem pensar em como o outro
também está se sentindo. O professor nesse momento é cobrado pela gestão, pelos
alunos, pelos pais, pela família e ainda é obrigado a lidar com informações
desconexas sobre uma possível volta ao trabalho, sem respaldo algum para
garantir a sua saúde física, mental e emocional, e dos demais que estarão aos
seus cuidados. Antes de atacar, ofender, agredir e depreciar um professor,
tente se colocar no lugar dele por pelo menos um dia!
Autor: Alexandre Muniz - Professor -
Neuropsicólogo Clínico e Psicopedagogo
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